sábado, 24 de novembro de 2012

As vitrines


          Todo dia eu a admirava. O jeito de menina marcava as pegadas de uma mulher segura que eu fazia questão de seguir. Não pense que a perseguia como alguém que tenta incessantemente alcançar o seu objetivo; não. Eu a perseguia pelo seu olhar que se deixava brincar, diariamente, pelas luzes coloridas da cidade grande. Ela não me conhecia: era apenas mais um diante do mundo que se apresentava a seus pés de dançarina.
      Eu trabalhava no teatro onde a moça se preparava para os espetáculos dos finais de semana. Ela não me conhecia: mas vez ou outra, nossos olhares se cruzavam, e parecia que dialogavam em um dialeto que, antes de eu entender, ela o desviava sem perceber.
       Logo após os ensaios, a dona da minha atenção seguia seu caminho pela avenida movimentada, cujas vitrines acompanhavam seu andar ritmado pela doçura dos seus passos. "Não faz assim. Não vai lá não." - as palavras quase me fugiam do controle quando eu a via se aventurar por esse mundo aos seus pés.
      Em uma dessas noites, como num ímpeto eu disse: "Dá tua mão. Olha pra mim.". Ao término da fala, eu despertei de um sonho que me colocou na realidade: eu apenas queria vê-la passar; eu era uma das vitrines da grande avenida, mas pegava os versos que ela derrubava no caminho. Só ainda não tive coragem para lhe entregar o poema.

Um comentário: